Notícias

Imagem

A pandemia do coronavírus agravou a desigualdade de renda e a pobreza no Brasil

Depois de um ano da maior pandemia sanitária mundial anunciada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 11 de março de 2020, o Brasil ficou mais desigual e muito mais faminto. No final de 2019, o Brasil havia sido destaque no relatório de desenvolvimento humano divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). De acordo com o estudo, o país era o sétimo mais desigual do mundo, atrás apenas de nações africanas.
 
Ainda em 2019, um estudo do Banco Mundial apontou que o Brasil possuía 51,7 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza, 24,7% do total da população com uma renda mensal de R$ 387,07
 
Em março de 2020, quando a economia começou a ser impactada pela Covid-19, o mercado de trabalho ainda estava fragilizado. Então, no segundo trimestre de 2020 a desigualdade de renda bateu recorde no Brasil, foi o que apontou o estudo “Efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho brasileiro”, divulgado pelo FGV Social (Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas). O indicador estudado na pesquisa foi o índice de Gini, que monitora a desigualdade de renda em uma escala de 0 a 1, sendo que, quanto mais próximo de 1, maior é a desigualdade. O do Brasil ficou em 0,6257 em março.
 
Isto foi péssimo para o Brasil, aconteceu em momento muito ruim para a economia brasileira. Naquela ocasião os dados do IBGE apontavam que a taxa de desocupação havia caído de 12% para 11,7%, entre 2018 e 2019. O país estava saindo de uma forte recessão, que começou no segundo trimestre de 2014 e foi até o final de 2016.
 
O estudo da FGV Social, investigou sobre a renda média dos brasileiros na pandemia, para além do problema da desigualdade. E os números confirmaram que houve sim queda significativa na renda do trabalho da população. 20,1% foi o tamanho da queda na renda média da população brasileira no segundo trimestre de 2020, na comparação com três primeiros meses do ano. Com isso, a queda de renda da população alcançou diferentes níveis. Os 10% mais ricos também tiveram perdas nos rendimentos, mas não tão substanciais como a população de menor renda que foi duramente atingida.

De acordo com projeções feitas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), divulgada em março de 2021. Existiam no Brasil, entre agosto de 2020 e fevereiro de 2021, cerca de 17,7 milhões de pessoas que voltaram à pobreza, passando de 9,5 milhões (4,5% da população) para 27,2 milhões em fevereiro (12,8% da população).
 
Para Daniel Duque, pesquisador da IBRAE/FGV (…) “A redução do auxílio emergencial é um fator que, além de puxar a queda da renda média, também tem grande efeito sobre a pobreza, principalmente por estar concentrada entre a população mais pobre do país”. Então, a redução do Auxílio Emergencial foi o fator preponderante para puxar a queda da renda média, fazendo um grande efeito sobre a pobreza.
 
O impacto da pandemia e do Auxílio Emergencial são, além de distributivamente maiores sobre os mais pobres, também são regionalmente mais fortes sobre o Nordeste e Norte. Como demonstrado no gráfico abaixo que, após a redução registrada do Auxílio Emergencial, a Pobreza Extrema teve maior alta no Nordeste, que passou o Norte com a maior proporção, tendo chegado a 10%. No Sul e Centro Oeste, o impacto foi quase nulo, e tal proporção da população continua em torno de apenas 2%.

Evidentemente que não pode deixar de citar o desemprego neste contexto. O IBGE divulgou no dia 30 de abril a taxa de desocupação referente ao trimestre móvel de dezembro de 2020 a fevereiro de 2021. Eram 14,4 milhões de pessoas desocupadas. A taxa é recorde da série histórica iniciada em 2012. Isso demonstra um cenário frágil do mercado de trabalho. Aliás, desde o início da pandemia, o número de pessoas sem emprego no Brasil aumentou 16,9%, e teve ainda um acréscimo de 2,1 milhões de pessoas em busca de trabalho, segundo o Instituto.
 
No Amapá, em 2019 existiam 335 mil amapaenses vivendo abaixo da linha da pobreza. Considerando que naquele ano a população estimada era de 845.731 habitantes isto representava 39,6% do total da população. Já na pobreza extrema eram 59 mil amapaenses nessa condição, segundo o IBGE (Indicadores Sociais – 2020).
 
Então, em 2019 o estudo do Banco Mundial apontou que 24,7% da população brasileira vivia abaixo da linha da pobreza. Já no Amapá eram 39,6%, de acordo com o IBGE. Um percentual bem acima da média nacional. Muito embora sejam metodologias diferentes, os números apresentados merecem sim uma reflexão, pois deixa a população amapaense ainda mais desigual em relação ao Brasil. Ademais, a desigualdade por ser um fenômeno de diferenciação entre pessoas de uma mesma sociedade, coloca alguns indivíduos em condições estruturalmente mais vantajosas do que outros.
 
Já com relação a fome, a Pesquisa de Orçamentos Familiares – POF (2017-2018), divulgada pelo IBGE em setembro de 2020 apontou que no Brasil viviam 10,3 milhões de pessoas com insegurança alimentar grave em 3,1 milhões de domicílios. O nível de Insegurança Alimentar Grave (IA grave) significa que houve ruptura nos padrões de alimentação resultante da falta de alimentos entre todos os moradores, incluindo, quando presentes, as crianças. A pesquisa identificou também que esse cenário foi proporcionalmente mais expressivo nos domicílios da área rural do Brasil.
 
O conceito de insegurança alimentar é empregado quando não há acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem que isso necessariamente comprometa o acesso a outras necessidades essenciais.
 
No Amapá, a mesma pesquisa levantou que 107 mil habitantes que viviam em situação de fome, classificadas com alimentação ruim e insuficiente. O indicador representava 13,2% da população do estado.

Estes números retratam um cenário antes da pandemia sanitária. Agora a realidade é bem pior. Um estudo coordenado por um grupo de pesquisadores da Universidade Livre de Berlim, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade de Brasília, realizado no fim de 2020, e que foi divulgado em abril de 2021, mapeou a parcela dos lares brasileiros que enfrenta fome ou acesso irregular à comida. O levantamento apontou que em 15% dos domicílios há privação de alimentos e fome.

Para o cientista político Lúcio Rennó, “A pandemia de covid-19 chega no mundo e em particular no Brasil no momento de redução da nossa capacidade de resposta estatal, dada a fragilidade fiscal do nosso país e de uma economia que dava passos muito lentos e muito graduais de recuperação, mas com ainda aprofundamento da pobreza e da desigualdade. Isso é uma consequência, quase uma lei que nós vivemos quando temos crises econômicas: os setores mais pobres da sociedade são os que mais sofrem. E sentem de forma mais imediata e rápida e são os que levam mais tempo para se recuperar desse processo”.
 
Documentar este cenário que vivemos no Brasil causa uma sensação de angustia. A pandemia escancarou, mais uma vez, o péssimo quadro da desigualdade social e econômica do país.
Também foi possível ver a deterioração da infraestrutura social, a partir de março de 2020, sentida com a intensidade em meio à crise econômica sanitária, não sendo possível lançar mão dos programas sociais.
 
No decorrer da primeira onda da pandemia, no ano passado, mais de 30% dos 211,8 milhões de residentes nos 5.570 municípios brasileiros tiveram de ser socorridos na etapa inicial do auxílio de R$ 600,00, sugerido pelo Governo Federal e aprovado pelo Congresso, segundo dados divulgados em julho de 2020 pelo IBGE. Enquanto corria o trâmite burocrático do auxílio emergencial, foi preciso identificar quem eram os necessitados invisíveis. Foi quando o governo federal descobriu, em plena pandemia, 38 milhões de pobres, sem carteira assinada e nenhum auxilio. Esses números foram divulgados em novembro de 2020 pelo Ministério da Economia.
 
Em junho de 2020 escrevi o artigo “Duas pandemias! Uma sanitária e outra econômica”, em que destaquei (…) que por inação dos nossos governantes estava preocupado, pois tínhamos o vírus também destruindo as finanças públicas do governo federal, estados e municípios criando grande endividamento público. Como foi possível constatar, as políticas públicas e os programas sociais que poderiam mitigar o efeito da pandemia com a transferência de recursos aos mais pobres tiveram a sua eficiência limitada por problemas de desenho ou até mesmo por restrições orçamentárias dos governos federal, estadual e municipal.
 
Portanto, fica constatado que as políticas públicas voltadas à proteção social da população avançam e retrocedem de acordo com o movimento da economia. Faz-se necessário que sejam implementadas medidas de estado constantes no combate à desigualdade de renda e alívio da pobreza.
 
*Por Adrimauro Gemaque, analista do IBGE, administrador (graduado em Administração Pública) e consultor em Política Pública e Articulista.
 
Referências:
 
NERI, Marcelo C. “Efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho brasileiro: Desigualdades, ingredientes trabalhistas e o papel da jornada” (2020). http://www.fgv.br/cps/Covid&Trabalho.
 
DUQUE, Daniel. Pobreza e desigualdade aumentam de novo: PNAD Contínua Covid mostrou impacto do Auxilio Emergencial nos indicadores sociais (2020).
 
 

*A opinião contida neste artigo é a do autor e não necessariamente exprime o posicionamento da DS Curitiba.

Fonte: EcoDebate

Comente esta notícia

código captcha
Desenvolvido por Agência Confraria

A Delegacia Sindical de Curitiba do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional) utiliza alguns cookies de terceiros e está em conformidade com a LGPD (Lei nº 13.709/2018).

Saiba mais sobre o tratamento de dados feito pela DS Curitiba CLICANDO AQUI. Nessa página, você tem acesso às atualizações sobre proteção de dados no âmbito da DS Curitiba, bem como às íntegras de nossa Política de Privacidade e de nossa Política de Cookies.