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Desigualdades raciais no Brasil e suas múltiplas dimensões

O tema das desigualdades raciais envolve fenômenos sociais de diferentes dimensões que, embora estejam relacionados, constituem esferas distintas de observação.
 
Por exemplo, o acesso à educação, progressão escolar, rendimentos, emprego e local de moradia são algumas das possibilidades de observação considerando apenas as dimensões de cunho socioeconômico.
 
Veja neste artigo, as outras dimensões da desigualdade racial e a importância de mudarmos nossas concepções acerca de questões estruturais em nosso dia a dia. Vamos lá?
 
O que pode reduzir as desigualdades raciais no Brasil?
Existem fatores que exacerbam ou mitigam as desigualdades raciais em nossa sociedade, desde mudanças estruturais como as de cunho demográfico, até políticas públicas inclusivas mais efetivas. Veja a seguir.
 
Queda da taxa de fecundidade e mudanças nos arranjos familiares
Em relação às mudanças estruturais, destacam-se as de caráter demográfico. São exemplos a queda contínua da fecundidade, inclusive entre os mais pobres, novos arranjos familiares e alterações no padrão da população economicamente ativa.
 
Crescimento econômico
Já no campo econômico, a primeira década deste século foi marcada pelo crescimento econômico e seus efeitos significativos no mercado de trabalho, como o aumento da formalização e da contribuição previdenciária, a valorização do salário mínimo e a elevação da escolaridade dos trabalhadores.
 
Políticas públicas mais inclusivas
No caso das políticas de inclusão, embora seus efeitos sejam reforçados pelas mudanças estruturais citadas, sua ampliação e reformulação são extremamente importantes. Elas contribuem para reduzir a taxa de pessoas em situação de pobreza, assim como a ampliação do acesso dos mais pobres a oportunidades antes restritas à parcela mais rica da sociedade.
 
Transferência de renda
No que concerne à diminuição da pobreza, as políticas de transferência de renda, como a renda básica universal, são fundamentais. Mesmo que não exista nenhuma condicionalidade ou critério de cunho étnico-racial, uma expressiva porcentagem dos beneficiários é de negros. Ou seja, na base da pirâmide social, políticas sociais sem recorte racial foram eficazes para melhorar a situação da população negra.
 
Ampliação das oportunidades de acesso à educação
No que diz respeito ao acesso às oportunidades de inserção nos estratos médio e alto da sociedade, tais mudanças foram representadas pela ampliação do acesso da população negra ao ensino médio e superior. Neste último nível de ensino, a inclusão deveu-se às políticas de ações afirmativas de recorte social e racial e à expansão do próprio sistema de ensino superior.
 
De acordo com os dados censitários, em 2000 a proporção de estudantes de 15 a 17 anos pretos e pardos que frequentavam o ensino médio era, respectivamente, de 28,3% e 31%. Em 2010, esses percentuais passaram a 49,7% e 53,7%.
 
No caso do ensino superior, o crescimento também foi muito expressivo. Se em 2000 apenas 6,3% e 8,4% dos estudantes negros e pardos entre 18 a 24 anos frequentavam as faculdades, em 2010 esses percentuais passaram a 30,4% e 27,8%, respectivamente. Ou seja, em dez anos quadruplicou a participação da população negra nesse nível de ensino.
 
Porém, os dados também revelam que, embora ocorra uma queda significativa das desigualdades raciais, elas persistem. A participação dos brancos nesses níveis de ensino era de 68,1% no caso do ensino médio e 60,7% no superior.
 
Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com base na Pnad-2007, realizou projeções para a diminuição da desigualdade racial. As projeções apontam que seria necessário manter o ritmo de queda durante ao menos quarenta anos para que se consolidasse uma sociedade racialmente mais igualitária.
 
Oferecimento de vagas C-Level em âmbito corporativo
No que diz respeito ao mercado de trabalho, apesar de haver um crescimento expressivo da participação dos negros com nível superior, não é o suficiente em cargos de liderança, conhecidos como C-Level.
 
Por isso, quando observamos a inserção de brancos e negros com nível superior, notam-se diferenças nos estratos ocupacionais. Há menor participação dos negros nos estratos mais altos, e entre os que possuem qualificações e inserções semelhantes, há distorções salariais.
 
Quais os maiores desafios para uma sociedade realmente pautada pela igualdade racial?
Quando se analisam os retornos do investimento em educação superior (considerando os rendimentos do trabalho), observa-se novamente que o aumento da escolaridade é importante. No mais, o fator não é decisivo para diminuir a desigualdade racial.
 
Esses dados vão ao encontro da literatura sobre desigualdade racial, que demonstra a existência de uma forte rigidez social no Brasil, independentemente de raça ou cor de pele. Ou seja, a classe importa.
 
Contudo, a rigidez social torna-se uma rigidez racial nas tentativas de manutenção de alto status na menor chance de mobilidade e na maior desigualdade salarial entre os mais escolarizados. Isto é, na competição social por espaços e posições de prestígio.
 
Raça, portanto, é um critério que configura a estratificação, principalmente no acesso aos níveis mais altos de ensino, em processos de mobilidade social e nos retornos dos investimentos educacionais.
 
Há um processo de redução das desigualdades raciais em curso no Brasil?
Podemos afirmar que há um processo de redução das desigualdades raciais no Brasil do ponto de vista redistributivo. Porém, deve-se enfatizar a importância das políticas públicas voltadas para a diminuição das desigualdades sociais e raciais nesse processo.
 
Os dados apontam que só houve uma efetiva diminuição das desigualdades raciais nos períodos em que o Estado brasileiro definiu políticas de inclusão. No mais, é importante ressaltar que faltam evidências mais explícitas que relacionem esses fenômenos.
 
A sobreposição de raça e classe é uma característica da desigualdade brasileira. Entretanto, políticas de cunho universalista não foram suficientes para combater as desigualdades raciais, mesmo com a sobre-representação dos negros na população mais pobre.
 
Vale lembrar que ainda não foram esgotadas as soluções de cunho social/universal, como a oferta de boa escola pública em especial nas regiões mais pobres. Mas a histórica indiferença da sociedade e do Estado brasileiro em relação à pobreza relaciona-se também com o fato de esse grupo ser majoritariamente negro.
 
Nesse sentido, as ações afirmativas de acesso ao ensino superior são importantes porque tocam no espaço de privilégio da classe média e dos ricos, no qual prevalece a presença da população branca.
 
Por fim, há um último aspecto importante acerca da desigualdade racial: aquele que não envolve diretamente desigualdades de bens e recursos. Em síntese, o tema da desigualdade racial nos obriga a pensar sobre suas múltiplas dimensões, assim como sobre os efeitos do racismo em sua produção e reprodução.
 
Em que situações cotidianas é possível evidenciar as desigualdades raciais e o racismo estrutural em nossa sociedade?
Há muitas possibilidades de observar as desigualdades raciais. Por exemplo, a violência racial, em especial a brutalidade policial com os jovens negros, fortemente pautada nos estereótipos do negro como criminoso em potencial.
 
Segundo dados apurados via Lei de Acesso à Informação junto às Secretarias de Segurança Pública do RJ, SP, BA, PE e CE pela Rede de Observatórios de Segurança Pública, a parcela negra da população é a que mais sofre violência em ações policiais.
 
Somente no estado do Rio de Janeiro, dentre as 1.814 pessoas mortas pela polícia em todo o ano de 2019, 86% são negros. Essa taxa de mortalidade de pessoas pretas no país é superior à de países em guerra civil.
 
O Atlas da Violência 2020, divulgado pelo Ipea e Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), aponta que, em dez anos (entre 2008 e 2018), os casos de homicídio de pessoas negras aumentaram 11,5%. Durante o mesmo período, a taxa entre pessoas não negras teve queda de 12,9%.
 
Além disso, rotineiramente nos deparamos com a estereotipação em torno das mulheres negras, que oscilam entre o confinamento no serviço doméstico e sua sexualização em torno da figura da “mulata”.
 
Essas mulheres vivem uma situação de exclusão não apenas pela cor de sua pele, mas também pelo seu gênero. Tradicionalmente, elas desempenham papéis na sociedade que não cabem apenas para si, mas lhes foram atribuídos ao longo do tempo e contribuíram para potencializar a sua experiência de exclusão social.
 
Por exemplo, exercem outras formas de trabalho sendo mães e cuidadoras de idosos da família, em um ambiente doméstico solitário que as restringe de ingressar no mercado de trabalho.
 
Como a maioria das mulheres negras não pode pagar por creches ou pelos serviços de terceiros, elas aceitam vagas de trabalho precárias. São atividades aquém de suas capacidades, seja técnica, seja educacional, e ocupações que não impedem a sua atuação junto à família, geralmente, empregos de carga de trabalho parcial.
 
Esse é um fator limitante para o seu desenvolvimento profissional e, principalmente, pelo acesso aos níveis mais elevados de renda.
 
O racismo incide em todas as dimensões da sociedade, nas formas de tratamento entre pessoas brancas e negras da mesma família, no modo como os negros ocupam posições de pouco destaque no segmento do entretenimento e nos meios de comunicação.
 
A lacuna temporal e dívida histórica criadas pela escravidão, que impediu os negros de obterem as melhores oportunidades de trabalho e ascensão profissional, locais dignos de moradia (segregação residencial) e acesso à educação e aos recursos básicos de sobrevivência e desenvolvimento por anos, também evidencia uma segregação social pautada pelo preconceito e um racismo velado, manifestado em falas e atitudes rotineiras das pessoas.
 
Está presente em piadas ou xingamentos. Nas demandas por “boa aparência” em anúncios de emprego e restrições de circulação em espaços mais elitizados do comércio. Na existência de elevadores de serviço para trabalhadores domésticos, que são em sua maioria negros e negras, e no crescimento exponencial das favelas e comunidades pelo país.
 
Nos últimos anos, o Brasil passou por transformações importantes que reformularam a agenda de estudos sobre as desigualdades raciais. Tais transformações foram associadas a mudanças de caráter estrutural e a formas de enfrentamento das desigualdades raciais por meio de políticas de inclusão social.
 
Os retrocessos evidenciados em ações de cunho político e o forte apoio popular pela manutenção da segregação racial demonstram que ainda temos um caminho longo a percorrer para combater a desigualdade racial no país.
 
Leio o artigo “Entenda o objetivo e a importância do Dia da Consciência Negra” e veja como você pode mudar suas atitudes na busca por mais igualdade em seu meio.

Fonte: Oxfam Brasil

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