Dentre esses países, o Brasil é, de longe, o maior exportador de produtos agrícolas, sendo inclusive o terceiro maior exportador mundial (US$ 79,3 bilhões em 2017) e um dos líderes em desenvolvimento agrícola, com crescimento anual da produtividade total de 3%, superado apenas pelo Nordeste da Ásia (3,4%). O relatório aponta ainda que houve relevantes iniciativas de pesquisa e desenvolvimento que contribuíram para esse crescimento, o que é uma ótima notícia.
Um fator essencial para a atração de novos investimentos é a manutenção de legislação adequada ao que se pretende. Na área tributária, apesar de estarmos longes de um modelo ideal, da alta carga tributária e da elevada complexidade dos tributos, o que leva à necessidade urgente de reforma que ao menos simplifique o sistema (as empresas levam 2.600 horas por ano para calcular tributos, em comparação com a média de 184 horas dos países da OCDE [3]), a tributação diferenciada do agronegócio já é um atrativo em comparação com outros segmentos econômicos.
Antes de se detalhar esse ponto, é importante ressaltar que a tributação diferenciada não corresponde a mero “privilégio fiscal” do agronegócio, mas sim, reitere-se, à aplicação de legislação específica que busca se adequar às peculiaridades do setor [4], o que está em linha com o disposto na Constituição Federal [5].
Dentre as regras, podemos citar inicialmente que, para fins de apuração do IRPJ e da CSLL, as empresas que desenvolvem atividade rural podem computar, como custo de depreciação, o valor correspondente a bens do ativo não circulante adquiridos, de forma integral e no próprio ano de aquisição [6].
A partir do ano seguinte ao de aquisição, a parcela anual correspondente à taxa de depreciação deverá ser adicionada ao lucro líquido para apuração do imposto. Além disso, as empresas que exploram atividade rural podem computar prejuízos fiscais de anos anteriores sem a limitação de 30% prevista para as demais atividades [7], para fins de apuração do IRPJ e CSLL.
Quanto ao PIS/Cofins, a legislação em geral permite a apuração de forma não-cumulativa. Ou seja, para se calcular a base de cálculo das contribuições, podem ser aproveitados créditos decorrentes de insumos adquiridos na atividade produtiva.
Recentemente, o STJ definiu, em caso representativo de controvérsia [8] (cujo entendimento se aplica aos demais pendentes de julgamento), que os insumos aptos a gerar direito a crédito são aqueles considerados essenciais ou relevantes para o processo produtivo, o que representou ampliação do entendimento restritivo sobre a matéria antes adotado pelas autoridades fiscais.
Ainda em relação a essas contribuições, diversos produtos relacionados ao agronegócio estão sujeitos à alíquota zero (para reduzir a carga tributária dos produtos-base da atividade rural ou de alimentos essenciais à população [9]) ou à suspensão do pagamento de PIS/Cofins [10].
Nessas hipóteses, a legislação permite a manutenção dos créditos de PIS/Cofins apurados em decorrência da aquisição de insumos em etapas anteriores, o qual pode ser objeto de pedido de ressarcimento e compensação com outros débitos federais [11]. Disposição semelhante existe em relação aos produtos exportados [12]. Há ainda a possibilidade de computar crédito presumido das contribuições em decorrência da aquisição de determinados produtos, como insumos para a fabricação de alimentos.
A legislação prevê benefícios semelhantes para o IPI. Como exemplo, o saldo credor de IPI acumulado e decorrente da aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem, aplicados na industrialização, inclusive de produto isento ou tributado à alíquota zero, pode ser utilizado para fins de ressarcimento e compensação com outros tributos federais [13].
Há ainda possibilidade de empresas produtoras e exportadoras de produtos nacionais apurarem crédito presumido do IPI como ressarcimento de PIS/Cofins, incidentes sobre aquisições, no mercado interno, de matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem, para utilização no processo produtivo[14].
Na esfera estadual, a legislação do ICMS também assegura incentivos como diferimentos, isenções e créditos presumidos, além de imunidade em exportações. Há, portanto, uma série de regras fiscais diferenciadas que podem ser adotadas pelas empresas do setor de agronegócio.
Em conclusão, passamos por um momento de forte demanda por iniciativas para superação da crise extremamente agravada pela Covid-19. Como o agronegócio tem participação muito relevante em nossa economia, seu desenvolvimento está diretamente relacionado com a retomada do crescimento do Brasil como um todo.
Uma das medidas de estímulo pode ser o incentivo ao investimento estrangeiro no setor, por meio da flexibilização das restrições à aquisição e arrendamento de terras por empresas nacionais cujo capital social pertença majoritariamente a estrangeiros, e que voltou a ter destaque em razão do Projeto de Lei nº 1179/2020 e do pedido do Ministro de Estado da Economia de que esse tema (dentre outros) seja apreciado com celeridade.
Eventual modernização legislativa nesse sentido tem boas chances de efetivamente atrair o investimento adicional buscado, inclusive porque já estão em vigor no Brasil regras tributárias que, apesar de estarem longe do ideal e da necessidade de reforma ao menos para sua simplificação, traduzem-se em benefícios fiscais importantes voltados às particularidades do agronegócio brasileiro.
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