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Ao contrário do que o Brasil precisa, Congresso insiste em reforma fatiada

Lira e Guedes querem apenas a mera unificação de impostos federais. Tributação de super-ricos não passa pela cabeça daqueles que deveriam representar o povo brasileiro
 
As últimas semanas têm sido intensas na política brasileira, sobretudo pelos desdobramentos que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado Federal tem provocado, com revelações de omissão deliberada do Governo Federal na compra de vacinas e na sabotagem do combate à pandemia do coronavírus (Covid-19). O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), buscando reduzir o protagonismo da CPI e voltar ao centro político, decidiu desengavetar a Reforma Tributária.
 
Após a leitura do relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) sobre as PECs 45 e 110, e a consequente extinção por parte de Lira da comissão mista que analisava o tema, parlamentares já passaram a defender mudanças no sistema tributário de forma fatiada, ao invés de uma reforma ampla, que promova reais mudanças, como é defendido pela DS Curitiba, Anfip, Instituto Justiça Fiscal e tantas outras entidades representativas, que congregam profissionais da área tributária e que apresentaram uma série de propostas ao longo dos anos para reduzir a desigualdade e promover justiça fiscal.
 
Em declaração feita nesta semana, Lira afirma que uma reforma fatiada possui uma probabilidade maior de aprovação. "Quanto mais pesada, pior de ser feita", declarou Lira, em entrevista ao programa Sem Censura, da TV Brasil. O presidente da Câmara já considera que caso não seja votada em 2021, a possibilidade de que a reforma caminhe no próximo ano é extremamente difícil devido às eleições, que mobilizam todo o Congresso e paralisam a pauta.
 
A decisão de Lira atendeu ao desejo de Paulo Guedes, que quer uma reforma somente com impostos federais, sendo PIS e Cofins em um primeiro momento. Estes foram alvo do projeto de lei encaminhado pelo Executivo, em julho de 2020. De acordo com fontes da Folha de S.Paulo, Guedes não teria ficado contente com o relatório de Ribeiro, uma vez que o mesmo propunha a unificação do IPI, ICMS e ISS junto ao PIS e Cofins.
 
Com a justificativa de que o fatiamento facilita o andamento de uma reforma, Lira vai de encontro ao projeto de Guedes, que visa apenas a simplificação do sistema, não alterando de fato o principal agente causador da desigualdade brasileira e da injustiça tributária. De acordo com os anseios de ambos, seriam analisadas separadamente as seguintes partes:
 
  • união de PIS e Cofins, criando a Contribuição sobre Bens e Serviços;
  • transformação do IPI em um imposto seletivo, aplicando-o em itens como cigarros e bebidas;
  • mudanças no Imposto de Renda, diminuindo a taxação sobre empresas e cobrando sobre dividendos e sobre instrumentos financeiros que hoje são isentos;
  • renegociação de dívidas com contribuintes, ao estilo de um Refis; 
  • e a recriação da CPMF em outra roupagem, a de “imposto digital”, tema que está proibido de ser comentado no Governo, mas que continua nos planos da equipe.
 
Para a presidente do Instituto Justiça Fiscal (IJF), Maria Regina Paiva Duarte, a posição do Brasil em apenas simplificar o sistema sem mexer no bolso dos mais ricos vai na contramão do que vem sendo feito no mundo todo, inclusive nos Estados Unidos. “Ainda que nos EUA o imposto sobre heranças seja mais elevado que aqui, que eles tributem lucros e dividendos distribuídos – o que não ocorre no Brasil desde 1996 – ainda assim a proposta é taxar mais os super-ricos, 0,3% da população americana que ganha mais de US$ 1 milhão e tem ganho de capital”, afirma Maria Regina, em artigo publicado no Sul21.
 
Tanto o relatório de Ribeiro quanto as propostas de Lira e Guedes em nada alteram o problema do Brasil: uma alta taxação sobre consumo, que afeta os mais pobres, enquanto que os mais ricos seguem pagando muito pouco ou nada de imposto sobre seus patrimônios.
 
Para o presidente do Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz), Rafael Fonteles, faz-se necessário em nosso país uma reforma ampla, conforme defendido pela DS Curitiba. “Conduzimos nossa discussão em cima dos tributos sobre consumo. O Brasil tributa muito o consumo, a folha de pagamento. E tributa pouco a renda e o patrimônio. Poderia se pensar em uma redução da tributação sobre folha e consumo desde que tivesse um contrabalanceamento aumentando a tributação sobre renda e patrimônio, conforme a linha geral dos países da OCDE”, defende Fonteneles, em entrevista para a Rádio Jovem Pan.
 
Não é possível que países de todo o mundo discutam soluções para aumentar suas arrecadações com base no aumento de impostos para os mais ricos, enquanto que o Brasil, que possui um dos maiores índices de concentração de riqueza no mundo, siga defendendo que os mais pobres continuem a pagar mais impostos que os ricos. É isso, afinal, que essas propostas defendem.
 
Que possamos aproveitar esse momento para termos, de fato, discussões importantes e necessárias para realizarmos mudanças profundas em nosso sistema tributário, como temos defendido há anos. Do contrário, se continuarmos com iniciativas que visem apenas unir impostos — a ponta do iceberg — e não vermos os reais motivos para estarmos onde estamos hoje, continuaremos afundando: os pobres morrendo afogados e os ricos com lanchas e botes salva-vidas fornecidos pelo Estado brasileiro.

Foto: Sérgio Lima/Poder360 
 
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