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Autonomia do Banco Central ou a terceirização da política

O Presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB) declarou, no dia 26 de outubro passado, a intenção de votar até o final do ano, naquela Casa, o PLS (Projeto de Lei do Senado) 102/2007, que dá ao Presidente do Banco Central e a diretores da instituição seis anos de mandato, com uma possível recondução. O Projeto foi originalmente apresentado pelo Senador Arthur Virgílio (PSDB – AM); o substitutivo ao Projeto, apresentado pelo Senador Francisco Dornelles (PP – RJ) está desde abril na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, presidida pelo Senador Lindbergh Farias (PT – RJ).
 
O pano de fundo dessa iniciativa exótica do Presidente do Senado é, em verdade, a insatisfação com a discussão de alianças nos Estados com vistas à eleição de 2014, ou seja, é a velha política de sempre, usando de questões de grande peso político e econômico, para, ao fim e ao cabo, contemplar interesses partidários.
 
Depois dos levantes populares de junho, os representantes políticos continuam a dedicar-se a manobras e a assuntos totalmente divorciados das demandas da maioria da população, quando não contrários ao interesse nacional, como é o caso desse Projeto. Sem contar que, numa saída à francesa, a reforma política vai se esmaecendo, perdendo cor, saindo da capa das revistas e jornais e migrando da Assembleia Constituinte para o obituário.
 
O PLS 102/2007 nada mais é do que requentar a velha discussão da autonomia do Banco Central, que foi corrente nos anos noventa até o início da nova década, na plenitude dos ideários do mercado, do liberalismo e desregulamentação. Sim, desregulamentação, porque ao liberalismo interessa desregulamentar o que se oponha à livre circulação do capital (legislação trabalhista, por exemplo) e hiper-regulamentar tudo o que garanta os seus direitos e interesses (contratos e, jóia da coroa, o controle da moeda).
 
A autonomia do Banco Central foi, numa época de triste memória, um dos pontos do acordo assinado por Pedro Malan e Armínio Fraga em 2002 com o FMI.
 
O Banco Central é a mais poderosa Agência Reguladora de um país: tem o monopólio da emissão de dinheiro, é o banco dos bancos (inclusive o seu superintendente) e do Governo e executor das políticas monetária e cambial, estabelece a taxa básica de juro da economia, por meio do Comitê de Política Monetária, garante o equilíbrio do balanço de pagamentos, negocia, em nome do Governo, com as instituições financeiras internacionais. Não bastasse tudo isso, no Brasil o Banco Central atua até mesmo nas áreas de arrendamento mercantil, crédito imobiliário e consórcios.
 
Em outras palavras, o Banco Central não é neutro, nem o pode ser uma instância governamental de profundo impacto sobre a vida de um país, que arbitra ganhos e perdas de classes, grupos sociais e econômicos, o poder aquisitivo da população, o privilégio ou não aos rentistas, a opção relativa, em uma determinada conjuntura e a cada circunstância, pelo desenvolvimento, emprego ou estabilidade. Não são, portanto, decisões técnicas, mas profundamente políticas, ditadas pela visão estratégica e pelos grupos sociais representados hegemonicamente na coalizão que está no aparelho de Estado em um determinado momento.
 
No limite, autonomia do Banco Central, portanto, seria terceirizar o Estado e entregá-lo àquela mão não tão invisível que já tem poder demais, para além dos âmbitos econômico e financeiro. As negociações que se passam no alto da República aproveitam-se da dificuldade do cidadão comum de perceber as implicações profundas para a sua vida de decisões tomadas em instâncias a ele inacessíveis. O antídoto, ao contrário do que muito se ouve no senso comum, é mais democracia – substantiva, e não apenas formal – e, principalmente, mais política. Afinal de contas, política é a instância do poder.
Curiosamente, a audiência pública do Senado que tratará da matéria, a realizar-se no próximo dia doze de novembro, terá como expositores o Presidente do Banco Central, o Ministro da Fazenda e a Febraban (Federação Brasileira de Bancos). Faltou alguém?
 
 
AFRFB Paulo Matsushita
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